por Rafael Abreu
Kill The Moonlight é importante para minha década porque é o meu disco de bolso. Quando eu me canso das esquisitices de um Fuck Buttons da vida ou mesmo da fase mais mainstream do Animal Collective (de “Strawberry Jam” pra cá, passando pelo “Person Pitch”, do Panda Bear), é ele o álbum que me lembra as minhas raízes e as melhora bastante, imaginariamente: eu, que cresci ouvindo boy bands e quase todos os egressos da turma do Mickey, poderia ter ouvido com muito gosto o órgão de “Small Stakes” e ter criado, ali, um amor que se dividiria com meu vício em “Me Against the Music”, da Britney, sem problema nenhum. Não é difícil imaginar um 2002 em que eu teria ouvido “Paper Tiger” trezentas mil vezes por dia (música para mim, naquela época, era mais pautada por faixas do que por álbuns), teria tentado imitar o beat-box do Britt Daniel em “Stay Don’t Go”, teria decorado, letra por letra, nota por nota, “The Way We Get By” – e teria saído para a rua assoviando ou cantando “Fighter”, da Cristina Aguliera.
Pois é. Minha pré-adolescência, nesse caso, teria sido dessas coisas bem pós-modernas. Mas se é para falar do que realmente aconteceu, outro motivo por que o disco significa tanto para mim é fato de que eu cheguei a ele bem tarde na década, depois de 2005 e antes de 2008 – por aí.
O importante mesmo é que o “Kill The Moonlight” não derreteu meu cérebro, não mudou a minha perspectiva de vida, não me deixou imaginando como era possível que um disco bom como aquele existisse. Pelo menos não de início. Não foi nada estrondosa a experiência de ouvi-lo pela primeira vez – foi mais uma descoberta pequena, o tipo de coisa que eu classificaria como menor. Não porque fosse ruim ou não fosse bom o suficiente, mas porque fosse tão mínimo em tantos sentidos, tivesse tanta coisa pouca que fizesse as canções excelentes.
Mas falemos do disco em si, e não de sua importância. E comecemos pelo fato de que todas as melodias são impecáveis: dá pra despir toda a roupagem de “Someone Something”, “Vittorio E.” e “Stay Don’t Go”, por exemplo, e ainda assim ver a boa forma do corpo das notas, que só precisariam de um acompanhamento destro de violão para fazerem jus a si mesmas. O engraçado é que, pra início de conversa, o disco já é esquelético. Mesmo com o tanto de elementos que a produção insere, aqui e ali, os arranjos são sóbrios e quase secos, se não fossem tão simpáticos. É assim com a maioria das faixas do álbum. Se fosse para resumir por que eu amo tanto o “Kill The Moonlight”, eu diria que é porque é nele que eu ouço os silêncios de que mais gosto.
Não é à toa que “Small Stakes”, a faixa que abre o disco, seja como se tivessem dado remédios de tarja preta para o Suicide, outra banda que basicamente fazia pop nu e minimalista. “Paper Tiger”, a melhor faixa do álbum, funciona como um relógio simpático: todo o arranjo é um pêndulo que se altera muito pouco durante seu curso, um crescendo de instrumentação que culmina na voz sussurrada de Britt Daniels. Se o ano de 2009 aclamou a simplicidade de um grupo como o xx, o Spoon já era mestre nisso desde o quarto álbum – desde 2002, em outras palavras.
O mínimo que se possa esperar para o futuro por tanto tempo adiado da banda é que eles estourem imensamente, que um single deles seja tão tocado quanto (urgh) “I Gotta Feeling”, que os jovens de 2030 ou 2040 (se passarmos de 2012) os ouçam como o moleque que ouve os Mutantes pela primeira vez e fica assustado com o quão pegajosas são composições como “Bat Macumba” ou “Senhor F”. É o tipo de coisa que só dá para se realizar com o tempo: só depois de muitos anos é que vai se perceber que o “Kill The Moonlight” não tem data.
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