Talvez Tulipa Ruiz não saiba (deve saber), mas dentre os significados da palavra “efêmero”, há um, especificamente para os estudos botânicos, em que é chamada efêmera a flor que abre e fenece no mesmo dia.
Efêmera também é o nome do primeiro álbum de Tulipa, e talvez haja (deve haver) uma referência no nome do disco à miríade de cantoras na atual cena musical brasileira. São tantas e tantas cantoras surgindo que a música, em geral já bem descartável nesse início de década, fica ainda mais difícil de se manter por muito tempo nos ouvidos de todos. Se encararmos o nome por esse sentido, o de passageira, a decisão de chamar um primeiro disco de Efêmera é ao mesmo tempo bastante consciente e ousada. Uma espécie de desdém calmo da atual situação da música.
Mas esse sentido é (deve ser) mais uma viagem de blogueiro que quer ver coisa demais onde não tem. Em entrevista à TPM, Tulipa diz: “A palavra [Efêmera] em si é mais usada no sentido de momentosa, atual, do que de meramente passageira. Até lembra Vinícius, ‘infinita enquanto dura‘”. Pronto. A resenha pode acabar por aqui, porque é exatamente isso que Tulipa Ruiz entrega no seu primeiro disco: música pop com ótimos arranjos, com os olhos no presente, sem esquecer do passado e sem preocupação com o futuro. E, quando toca, o disco é aquilo mesmo: infinito enquanto dura.
Exagero? Talvez um pouco, mas me parece claro que a sensacional voz de Tulipa se eleva como a vaca profana de Caetano, um pouco acima da manada de cantoras que avança anualmente sobre a música brasileira. Cheia de barulhinhos bons, cantando o cotidiano paulistano, Tulipa é ousada quando usa a sua voz, causando um estranhamento gostoso de ouvir, mais perceptível na faixa-título, em Pedrinho e em Sushi. Mas, ao mesmo tempo, lado a lado com esse certo estranhamento, a voz de Tulipa é o de mais agradável que aconteceu na música nacional este ano, e a cada canção o ouvinte não tem dúvida: essa sabe o que faz com a voz.
Com participações especiais como as de Negresko Sis (na faixa título), Kassin (no ótimo baixo de Brocal Dourado), o irmão Rodrigo e o pai Luiz Chagas, além de Maryana Aydar, Tiê, Stéphane San Juan, entre vários outros (inclusive na arte gráfica do encarte), Efêmera não é um disco definitivo, mas um formidável começo. Com canções ótimas como Efêmera, Pontual, Sushi, Às Vezes e a imbatível Brocal Dourado, resta esperar e ver o que vai se tornar Tulipa Ruiz.
Mas fica a dica: tulipas não são dessas flores efêmeras.
[“Efêmera”, Tulipa Ruiz. 11 faixas com produção de Rodrigo Ruiz. Lançado pela YB Music em junho de 2010 e disponível para audição aqui.]
[rating: 4/5]
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