Podem me contar entre aqueles que, depois do lançamento de “Around the Sun”, de 2004, achavam que o R.E.M. não tinha no seu estoque nem uma cançãozinha mais ou menos memorável para oferecer, quem diria um álbum inteiro. A história oficial é de que o “retorno” da banda à forma aconteceu no disco anterior, “Accelerate”, de 2008, o que é parcialmente verdade. “Accelerate” foi mais um triunfo de foco e energia do que propriamente a volta consistente de grandes composições. Também não foi uma volta deliberada ao som “clássico” da banda, aquele dos anos 80. Foi mais um retorno – parcial – aos riffs de “Monster”, lançado em 1994, um disco de “grunge” meio errado com algumas boas faixas, só que dessa vez “Accelerate” vinha com uma pegada punk mais explícita e…acelerada.
Chegamos então em 2011, ano em que, depois de quase duas décadas, o R.E.M. nos apresenta uma nova grande coleção de canções, certo? Bem que eu gostaria, mas não é exatamente isso o que “Collapse Into Now” nos oferece. Este trabalho não é o tour de force melódico de “Automatic for the People” nem traz algo de realmente inovador ao som da banda, o que para os fãs não deveria chocar, pois o R.E.M., no fim das contas, sempre foi um grupo classicista. A singularidade da banda, desde os anos 80, esteve mais nas letras e na assinatura melódica dos vocais de Michael Stipe do que no seu som, basicamente uma re-imaginação da Rickenbacker dos Byrds filtrada pela estética do punk e pós-punk. Mas isso não é necessariamente ruim, porque toda vez que eles tentaram “experimentar” e “atualizar” sua sonoridade drasticamente – com a exceção do bom “New Adventures in Hi-Fi” -, falharam miseravelmente (vide “Monster”, “Up” e “Around the Sun”).
Mesmo com essas ressalvas, “Collapse Into Now” acaba sendo o melhor disco dos caras desde a saída do baterista Bill Berry, em 1997. Ou seja, lá se vão quase quinze anos até a banda desaguar nesta bela surpresa. O que exemplifica esse verdadeiro “retorno” do R.E.M. é um par de canções, “Uberlin” e “Oh My Heart”. “Uberlin”, em especial, talvez seja a primeira grande canção que eles lançaram desde “Immitation of Life”. O resto do álbum é uma mistura de sonoridades familiares ao trio, indo dos bandolins que a banda usava no início dos anos 90 à sonoridade de guitarras mais pesadas do disco anterior. Em termos de composições, afora as duas excelentes canções acima, a qualidade varia do memorável – “All the Best”, “Mine Smell Like Honey, “Walk It Back” – ao descartável – “That Someone is You”, “Blue” -, com um miolo de boas senão marcantes faixas completando o trabalho.
É no sequenciamento e na fluência com que a audição ocorre que “Collapse Into Now” sofre um pouco. Ao contrário do disco anterior, que trazia uma primeira parte frenética que ia diminuindo ao poucos e, no final, levantava o volume novamente, este álbum deixa as canções meio descoladas umas das outras, trazendo a formúla porrada-balada-porrada-balada como um subterfúgio para o ouvinte não apertar o shuffle de uma vez. Outro problema é a falta de imaginação da produção, assinada aqui por um medíocre Jacknife Lee, que soa cristalina e empolgante, porém sem nuances que se revelam aos poucos – justamente o que costumava ser uma das marcas do R.E.M.. Apesar dessas falhas, a consistência das composições e das letras são o que fazem o disco se destacar. Stipe mudou o fraseado misterioso da sua juventude por uma abordagem mais direta e reflexiva – em alguns momentos até bastante otimista -, discorrendo sobre mortalidade, mudança e sobre política (pessoal e coletiva).
O R.E.M. é um daqueles poucos casos de grupos que chegaram ao sucesso quase somente pelos méritos de suas canções, lançando uma sequência sensacional de álbuns em poucos anos, alargando a sua base de fãs, porém cedendo, acertando ou errando apenas em função das suas ambições artísticas. Quando o disco termina – principalmente lá pela quinta audição – é difícil não ficar satisfeito com este que já é o 15º lançamento desses veteranos. Eles, para mim, sempre vão ser a maior banda da sua geração (a dos anos 80), e é uma imensa e rara surpresa – o leitor já notou o afeto – que entrem na sua quarta (!) década fazendo música pop com tanta paixão e relevância.
[“Collapse Into Now”, R.E.M. 12 faixas produzidas por Jacknife Lee e pela própria banda. Lançado em março de 2011 pela Warner Bros.]
[rating:3.5/5]
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